29 julho 2005
Cisão
A intersindical americana AFL-CIO está em crise. Uma coligação de sindicatos em resposta à reeleição presidencial de John Sweeney, abandonou esta federação.
Ninguém arrisca análises sobre que diferenças políticas separam os dois grupos. Sweeney é reconhecido como um dos dirigentes sindicais mais à esquerda das últimas décadas, estendendo a intervenção da AFL-CIO além do mero economicismo, o que nos dias que correm tornou-se um grande risco para quem aspira influenciar o centro (se ainda se pode chamar centro) político. Os críticos respondem com uma estratégia centrada no recrutamento de novos membros mas a custo de silenciar mais uma das poucas vozes opondo a política militarista e anti-social da Casa Branca. Será que este oportunismo de silêncio ajuda a causa trabalhadora?
28 julho 2005
Foi hoje
O IRA deu por finda a luta armada.
P.S: a minha actividade neste blog começa a ser a dos obituários...
27 julho 2005
Censura
1. Tony Blair mudou o tom. A plácida confiança com que respondeu aos atentados em Londres, tranquilizando a populaça que não era afinal coisa grave e que os responsáveis não tardavam a ser castigados, foi descartada. A substituir a serenidade está um discurso acusador, indignado, ofendido, dorido, um acumulado de emoções. O Tony Blair que banalizava a tragédia à quatro dias e trivializava o medo, agora quer personificar a dor nacional e a sua justa raiva.
Esta transformação emocional tem um objectivo imediato. Blair acusa que discutir as “santas” guerras do eixo EUA-RU é dar uma justificação ao injustificável. Esses são argumentos que não podem justificar o que se passou, diz Blair, e continua que aceitar os argumentos é dar-lhes credibilidade e ajudar ao recrutamento terrorista. É agora interdito falar na guerra contra o Afeganistão e o Iraque, é ser-se com os terroristas. Quem o diz é o primeiro-ministro-totem de indignação popular, e o primeiro-ministro-vítima que se exonera de qualquer crítica ou responsabilização pelas mortes de 7 de Julho.
2. A democracia britânica é uma democracia a guião. Máscara segue máscara, papel segue papel, e o politico é um actor entre improviso e orquestração. Como espectáculo funciona melhor que a democracia portuguesa, onde o primeiro-ministro tropeça sobre si mesmo para não responder a comunicação social que o persegue como uma matilha, quando não insulta meio mundo do alto do seu pedestal governativo. Aqui ainda há silêncios, ainda há hesitações, ainda há gaffes!
26 julho 2005
Medo e terror
Os recentes atentados de Londres vêm mais uma vez demonstrar o óbvio. Num país que, devido à pesada herança do IRA têm uma vasta experiência de segurança, métodos anti-terroristas, polícias secretas, etc., existe tanta capacidade para evitar um ataque terrorista como para estabilizar o Iraque, ou seja, nenhuma. Claro, arremessa-se logo o argumento de que já terão conseguido evitar muitos, estes simplesmente escaparam, mas o que está mais do que provado, quer pela própria história do IRA, quer pela actual cruzada anti- Al-Qaeda, ou pelo securitarismo ridículo da polícia estado-unidense, armados até aos dentes, é que é impossível a segurança perfeita. Não é possível controlar toda a gente, não é possível ter um polícia em cada esquina, não é possível evitar atentados se alguém estiver realmente determinado a fazê-los. A questão principal é: todos sabem isso. Os Bush, Blair, e todos os que são responsáveis por esta febre securitária que se tenta legitimar no medo das pessoas, sabem que não é possível evitar todos os atentados. Eles sabem que o terrorismo só pode ser eliminado se os conflitos que estão na sua origem forem resolvidos, se os terroristas perderem os argumentos para conseguir o apoio das populações, daí recrutando novos terroristas. Mas sabem também que resolver esses problemas vai contra as ambições imperialistas, e que contradiz a brutal acumulação de riqueza e exploração geradas pelo capitalismo. Por isso, aproveitam este medo popular e o perigo terrorista para atentarem cada vez mais contra os direitos dos povos e dos cidadãos, para eliminar os pequenos vetígios de democracia ainda existentes, conseguindo com isso manter este sistema caduco por mais tempo. É um mundo orwelliano, o que se está a desenhar.
21 julho 2005
"Beam me up Scotty"
Partido dos Trabalhadore$
Deprimentemente, descobre-se que o PT é somente um desses vampiros que na história do movimento operário se disfarça de popular, se justifica com uma política social mas que não é mais que um criado à mesa do poder.
19 julho 2005
Faz-me um desenho
18 julho 2005
Na sombra do Iraque
Causou a fúria do governo britânico, notavelmente do tradicionalmente passivo ministro dos negócios estrangeiros – Jack Straw. Quebrou o confortável silêncio dos políticos e forças de segurança que se congratulam por uma desgraça bem gerida, sem pânicos públicos e interrogações políticas. Um relatório independente notou o óbvio, que a guerra contra o Iraque e contra o Afeganistão foram motivos próximos para os atentados em Londres.
Talvez os britânicos ainda vençam o torpor de esquecimento que o poder lhes impõe…
15 julho 2005
Unidade de quê?
A “vigiliar” os atentados de 7 de Julho a palavra que mais se ouve é “unidade”. A palavra ecoa sem objecto definido: “unidade” dos londrinos, “unidade” dos europeus… É certamente “unidade” entre os parlamentares que elogiosamente agradecem a calma do primeiro-ministro face à tragédia. Mas que outros objectos tem? E que para que serve?
A “unidade” parece dar aos britânicos algo para sentir, e para fazer. Ouve-se que o objectivo dos terroristas era dividir a população britânica. Ouve-se que para os combater é preciso preservar “unidade”. A “unidade” torna-se resposta para tantas perguntas.
Mas o mais importante efeito desta psicologia é que a “unidade” impede que novas interrogações, daquelas que fogem ao controlo dos políticos e da sua corte. Para manter a “unidade” não se questionam as explicações de Blair ou Livingstone. Impõe-se um silêncio sobre a responsabilidade do estado Britânico na revolta das comunidades islâmicas. Faz-se da guerra do Iraque o mais perigoso tabu do discurso político.
Debater, discordar, opor o governo deixa de ser um direito de cidadania, passa a ser um acto sedicioso, alegadamente em apoio dos terroristas. Estas democracias que nos exortam a defender das forças do mal, não são assim tão livres.
13 julho 2005
A culpa é da escola...
Falar mal da escola anda na moda. Perante os resultados dos exames de 9º ano de matemática, toda a gente aponta o dedo aos privilegiados professores. A escola não exige, a escola desculpabiliza, a escola facilita, os professores são mal formados, e qualquer um dava melhor professor do que aqueles que lá estão...Concordando que existem maus professores, como existem em todos os sectores profissionais, não me parece que o insucesso escolar possa ser justificado por aí. Se calhar devíamos olhar para o modo como a sociedade portuguesa olha e valoriza a escola. Cada vez mais as escolas são vistas como um depósito de miúdos, face aos crescentes e crescentemente desregulados horários de trabalho dos pais, onde é suposto os alunos aprenderem tudo. Os pais demitem-se de dar a educação básica, e exigem-na da escola. Mas o problema principal passará pela baixa valorização social da escola. As nossas taxas de abandono escolar continuam assustadoramente altas, muito provavelmente porque o adolescente que larga a escola consegue rapidamente encontrar um qualquer trabalho mal pago e a tempo parcial, para poder comprar os ténis e o último telemóvel. Porque, naquela idade, são estas as prioridades que a sociedade de consumo lhes impõe. Isto se pensarmos nos grandes centros urbanos, porque se olharmos para o interior, ou para as grandes zonas industriais, vemos pais a dizerem aos filhos para largarem a escola, porque na fábrica de têxteis que vai ser deslocalizada daqui a algum tempo há uma vaga para ganhar metade do ordenado mínimo...As famílias portuguesas não valorizam a escola, muitas ainda não suportam o custo de um filho que não se torna rapidamente uma fonte de rendimento, não a reconhecem como motor de mobilidade social, e isso dever-se-à ao facto de o nosso mercado de trabalho também não procurar a qualificação, mas ainda a mão-de-obra barata. Se a própria família não estimula o aluno a frequentar a escola, esta difícilmente o conseguirá. E perante a constante ameaça do abandono, o esforço da escola não está orientado para o ensino de excelência exigente que todos querem, mas procura tão somente evitar o abandono e transmitir mais algumas competências. A escola que temos é o reflexo linear das condições sociais existentes. Não há milagres.
10 julho 2005
9-11 e 7-7
Para os Americanos os atentados terroristas de 11 de Setembro foram um evento de significado histórico. O ataque foi revisitado incansavelmente, nas imagens dos aviões a mergulhar sobre as Torres Gémeas, nos testemunhos dos sobreviventes ou das famílias dos falecidos. Os media celebravam os atentados como um episódio único em que a banalidade do dia-a-dia era ferida pela imaginação mortífera de um inimigo sem nação, sem ideologia, quase sem rosto. Os políticos escreviam o guião acompanhando as emoções servidas a todos os minutos, como nas bandeiras que vestiam carros e casas, como nas campanhas de caridade que se multiplicavam pelo país. O 11 de Setembro foi de imediato comparado com o ataque a Pearl Harbour (que iniciou a Segunda Guerra americana) para assim assinalar o início de uma nova guerra. Aproveitando a galopante confusão enraivecida de uma nação que não conseguia entender o que se havia passado, a Casa Branca declarou guerra ao resto do mundo. O inimigo foi inscrito como todos aqueles que se opõem à “liberdade”, sinónimo (mitológico) da nação americana, ou seja todos os que se opõem aos EUA. O difuso inimigo islâmico que se esconde do Sudão a Indonésia, o menos difuso inimigo nuclear do Irão à Coreia do Norte ou o inimigo diplomático centrado nas Nações Unidas e nos arrogantes franceses, formavam a coligação anti-americana.
Nada do que se passou nos EUA se repetiu no Reino Unido. Passado um dia sobre os atentados os britânicos esforçam-se por esquecer. O evento não é repetido em noticiários, vigílias ou campanhas de caridade. Os media ocupam-se com o encontro do G8 ou com a celebração da vitória aliada na Segunda Guerra Mundial, mantendo a sua programação familiar e sem fomentar debate sobre o ataque. Os políticos que falam com solenidade e com determinação encenada nos rostos não extraem grandes lições sobre o futuro da nação ou da geopolítica. Há um incentivo para não se pensar, para não se falar, não vá a populaça fazer as contas e perceber que talvez a guerra no Iraque tenha motivado as dezenas de mortes em Londres. Há um incentivo para não dar razões ao milhão de pessoas que saíram à rua a 15 de Fevereiro de 2003 para acordar do seu sono. O inimigo desta feita não é corporizado, embora se reconheça a mão islâmica no ataque (varias explosões simultâneas, sem aviso e dirigidas à população civil) recusa-se nomear o ataque como obra da Al Qaeda. O 7 de Julho é comparado com um dos múltiplos ataques do IRA, só mais um na história de uma cidade que há muito se habitou ao terror.
E tudo isto funciona… As pessoas seguem no estreito caminho do dia a dia a engolir o trauma das mortes, a ocupar o silêncio com as banalidades dos atrasos nos comboios, ou as incertezas do tempo.
08 julho 2005
Pérolas dos treinadores de bancada
O senhor andava pela quinta década da sua vida, e fazia-se acompanhar de uma senhora, presumivelmente a esposa, com um aspecto algo mais velho. Enquanto esperávamos ordeiramente nos bancos de uma dependência do serviço nacional de saúde, por entre conversas que me chegavam apenas como ruído, eis que o dito quinquegenário solta uma pérola de sabedoria, comentando os atentados de Londres: "...e se eles não tivessem invadido o Iraque, ainda era pior. Tínhamos aí atentados por todo o lado..." Não resisti, olhei para o sujeito, com uma expressão que devia ser estranha e certamente pouco discreta, e deixei de conseguir ouvir a brilhante linha de pensamento...
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