30 novembro 2007

 

Com a faca e o queijo


Israel tem um problema por resolver: como manter os colonatos, determinar unilateralmente as suas fronteiras e as da Palestina sem parecer intransigente? Como permanecer no papel de vítima do terrorismo árabe, enquanto destrói cidades e mata civis? Há que, ao longo de 40 anos, participar em conferências de tempos a tempos.

Duas semanas antes de Annapolis, já Israel se preparava para o encontro, estabelecendo as seguintes condições:

* Redefinição das áreas consideradas ocupadas. Contra o que foi proposto pelo Quarteto (EUA, União Europeia, Russia e Nações Unidas), Israel determinou que as áreas ocupadas não incluem nem os colonatos de maior dimensão nem Jerusalém. Assim, o que está em negociação é conceder à Palestina 15% do território (em vez dos já inaceitáveis 22% propostos pelo Quarteto). Esses 15% de terra estão truncados e fragmentados, sem ligação entre si.

* Reconhecimento de Israel como um “estado judeu”. Depois de aceitar a existência de um estado israelita sobre território palestiniano, os palestinianos têm agora que o reconhecer como judeu. Em Israel, 20% da população é palestiniana, católica e muçulmana. Basear a constituição do estado na religião é afirmar a discriminação e xenofobia. A provar as intenções discriminatórias desta regra, Tzipi Livni, ministro dos negócios estrangeiros, afirmou que o futuro dos cidadãos árabes de Israel é na Palestina, não em Israel.

* Implementação tardia dos acordos. Israel reserva-se no direito de determinar a data de implementação de qualquer negociação que venha a ser feita, e o adiamento pode ser estendido até ao cessar completo da resistência palestiniana. Com o precedente que temos, Israel determina ao sabor dos seus interesses qualquer acto, criminal ou de resistência, como terrorismo.

Se tudo isto falhar, Israel e os EUA podem declarar um estado palestiniano “transitivo” e ditar as suas fronteiras, territórios e soberania. A soma final de toda esta farsa só tem um nome – chama-se apartheid – que se traduz em “separação” do Afrikaner. Curiosamente, ou talvez não, este é precisamente o termo usado em hebreu para designar esta política – “hafrada”.

Quem denuncia estes e outros factos, não é um árabe fanático nem nenhum esquerdista radical. É Jeff Halper, coordenador do comité israelita contra a demolição de casas, no seu artigo “Quando o roteiro para a paz é uma rua de sentido único”.

Comments:
Cara Dolores

Desculpe lá ser chato, eu sei que não vou afectar em nada a sua opinião em relação a Israel, mas deixe-me só dizer o seguinte. Após décadas de guerras e ódio figadal entre Israel e o Egipto, e Israel e a Jordânia, há agora paz. 28 anos de paz com o Egipto e 13 anos de paz com a Jordânia. Não me parece mau. Bem sei que a questão palestiniana é diferente. Só estou a tentar dizer que algumas das conferências em que Israel tanto gosta tanto de participar às vezes dão resultados. Chamo-lhe também a atenção para o facto de só haver conferências de paz comparáveis à de Annapolis desde Camp David. A razão é simples: ninguém até 1977 esteve disposto a reconhecer Israel. E eu não estou a falar de reconhecer Israel nas fronteiras de 1967. Estou a falar do reconhecimento de Israel nas fronteiras do armistício de 1949. Estou a falar de reconhecimento tout cours. Lembro-lhe também que o Egipto foi expulso da Liga Árabe durante 10 anos por ter feito a paz com Israel. Quero com isto dizer que só recentemente (desde que a OLP decidiu reconhecer Israel) se tornou sequer possível ter negociações de paz israelo-árabes sérias. Lembro-lhe também que as tentativas de aproximação diplomáticas em relação a vários países árabes que Israel fez imediatamente após a Guerra dos Seis Dias foram inviablizadas precisamente porque naquela altura (e eu sublinho, na altura!) ninguém na região estava preparado para aceitar a existência de Israel (em seja que fronteiras fosse). Mais tarde, é verdade que Israel comete o pecado original que é colonizar os territórios conquistados em 1967, dificultando assim infinitamente qualquer solução negocial. Enfim, tudo isto só para dizer que Israel não pode fazer a paz sozinho e que a história da ocupação da Palestina está intimamente ligada à dificuldade de Israel em ser aceite na região. De resto, pergunto-me porque é que a Dolores e os seus colegas do Bitoque duvidam tanto de que os israelitas sejam pessoas como as outras, e que a paz lhes convém tanto como aos palestinianos. Diga-me, para si a solução é qual exactamente. Acabar com Israel? Assim haverá paz e democracia no Médio Oriente?
 
Caro Oppenheimer,

Neste caso também tens paz, 15% de paz...
 
Oppenheimer,

A solucao para a paz e' a coexistencia em igualdade de palestinianos e israelitas. Na situacao actual, o minimo e' o direito de retorno dos refugiados, o fim dos colonatos que retalham a Cisjordania, fim dos checkpoints, das incursoes militares e snipers nos telhados, fim das milicias de colonos armados, soberania fiscal e comercial para a autoridade palestiniana, amnistia para os presos politicos e inspeccoes ao programa nuclear israelita.

Estas condicoes nao deviam ser questoes politicas ou discutiveis. E' o minimo dos minimos reconhecer que os palestinianos sao gente.

E agora que respondi 'a tua pergunta, responde tu 'a minha: o que achas das pre-condicoes impostas por Israel 'a realizacao da conferencia?
 
oppenheimer,

Foi bonita a aula, pá
Fiquei contente
E inda guardo, convictamente
Uma dúvida cá para mim

De que serve essa história, pá
São migalhas certamente
Por esquecer este presente
Feito tão intransigente assim

Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei também quanto é preciso, pá
Navegar, navegar

Canta a justiça, pá
Lá estão carentes!
 
Cara Dolores

Para responder à tua pergunta. Não me agrada nada uma moda recente na política externa israelita que é a de colocar n condições a negociações: só negoceiam com a Síria se eles deixarem de apoiar o Hamas e a Jihad Islâmica; só negoceiam com os Palestinianos quando eles forem capaz de fazer o que os próprios israelitas nunca foram capaz de fazer: colocar ponto final ao terrorismo. Não me agradam as pré-condições e concordo que elas são usadas por Israel para adiar as decisões difíceis. Mas acho importante o processo de Annapolis nem que seja para obrigar os maximalistas de ambos os lados a revelarem-se (como se revelou o Hamas e como se revelam os fanáticos adeptos de Liberman). Mas repara que os israelitas passaram anos a dizer que só se sentavam à mesa com os palestinianos se e quando eles "cumprissem a primeira fase do road map" (como se os israelitas cumprissem a deles) e agora cá estão a comprometer-se com negociações sérias. A ver vamos, Dolores. Eu prefiro ser optimista. Talvez não tenha o luxo de ser pessimista porque apesar de tudo sinto bastante empatia em relação ao destino de Israel. E porque acredito que o objectivo do sionismo sempre foi o de construir um país onde os judeus pudessem estar a salvo de perseguições, ao mesmo tempo que construíam uma sociedade livre e democrática. Acho portanto que o sonho sionista só será realizado quando Israel for aceite pelos seus vizinhos e, portanto, quando os palestinianos realizarem as suas legítimas aspirações a um país. E sim, quando isso acontecer, tudo é possível. No dia em que houver paz na região, sou a favor do desarmamento nuclear de Israel, sob controlo da ONU etc. Espero que isto responda a algumas das tuas perguntas. Ah, concordo com todas as tuas "condições" para a paz, com a ressalva de que o direito de retorno dos refugiados deve ser limitado à Palestina de '67 (Cisjordânia e Gaza). Poderia haver um retorno simbólico de algumas pessoas para Israel. Mas uma "condição" que tu não referes e me parece importante: parte de qualquer acordo de paz deveria ser um reconhecimento formal por parte de Israel de que a fundação do Estado em 1948, para além de corresponder às legítimas aspirações milenares do povo judeu (durante séculos exprimidas pelo sionismo religioso, mas mais recentemente pelo sionismo laico), também foi responsável pelo sofrimento do povo palestiniano. Para além da obrigação moral que esta na base desta declaração formal, há também um imperativo legal: Israel deve partilhar a responsabilidade (financeira etc) pelos refugiados que não podem voltar para Israel, e que devem ser compensados de outra forma. Também não concordaria com inspecções ao programa nuclear israelita muito cedo. Simplesmente parece-me que essas inspecções - que devem servir como prelúdio para o desarmamento nuclear israelita - devem ter lugar a seguir à celebração de acordos de paz com todos os países da região, incluíndo o Irão. Pronto, já me alongei demais. Desculpa lá.
 
Quando e' que uma bomba nuclear e' uma arma de defesa?
 
Caro Cabral

Respondendo directamente à sua pergunta. Uma arma nuclear serve como arma de defesa quando por exemplo durante a primeira guerra do Golfo Israel comunicou a Saddam (por intermédio do rei da Jordânia) que qualquer uso de uma arma química contra Israel teria como resposta uma retaliação nuclear. Os jordanos passaram a mensagem e por isso é que Saddam se fartou de mandar scuds... com ogivas convencionais (não sei se se lembra, ou até se acha que isso é uma punição merecida por Israel ocupar a Palestina). Como sabe, Cabral, Saddam usou armas químicas contra o seu próprio povo e contra o Irão. Não é difícil de imaginar que estivesse disposto a usá-las contra Israel. Nessas alturas a ambiguidade nuclear israelita, mais do que útil, é fundamental.
 
Essa dita de "ambiguidade" nuclear (o termo mais estúpido, pois de ambiguidade não tem nada) dava jeito a muito país para não ser agredido...
 
invadido...
 
ocupado...
 
O melhor é mesmo todos os países terem essa política...
 
Agradeco muito a generosidade com que, como sempre, acrescenta palavras ao que eu digo - "até se acha que isso é uma punição merecida por Israel ocupar a Palestina." Compreendo que as minhas declaracoes nao cheguem para descrever a caricatura que tem de mim, e prometo continuar a ser tabua rasa para as suas inscricoes.

A minha pergunta tinha uma simples intencao. Ameacar o uso de uma arma nuclear, que e' afinal ameacar dizimar milhares, dizimar civis porque nao ha alvos militares para armas nucleares, nao me parece politica para um estado democratico. Nem e' uma pratica aceitavel para mim o que se fez e faz a Mordechai Vanunu, um pacifista que em sentido algum tem ligacao ao terrifico e insidioso inimigo arabe.
 
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