01 outubro 2007

 

O divórcio entre o marxismo e o feminismo


A versão canónica da "questão feminina" no marxismo tem mais de 120 anos. Friedrich Engels argumentou que o fundamento para a opressão das mulheres no capitalismo era a propriedade privada. A linhagem masculina serve de mecanismo para a acumulação da propriedade privada, e o menosprezo das mulheres era o seu contraponto. Segundo Engels o problema era o da família burguesa, entre o proletariado haveria igualdade entre os géneros.

Durante muito tempo esta concepção manteve-se dominante entre a esquerda revolucionária. Só foi posta em causa nos últimos 30 anos quando mulheres, participando em massa nas lutas da esquerda, reclamaram em voz alta o que sempre souberam: a patriarquia insinua-se também entre o proletariado, e nem sequer a esquerda lhe escapa. As organizações de esquerda ofereceram às mulheres o trabalho secretarial, o de limpeza da sede, o de porta-voz da posição política redigida pelos intelectuais homens. Justamente insultadas por este comportamento, muitas mulheres abandonaram essa esquerda, ou criaram organizações suas: feministas e socialistas, ou rejeitaram por completo o ideal comunista. A verdadeira expressão do "dividir para conquistar" vem dos homens. Eles controlando os movimentos de classe e para conservar o seu privilégio (tantas vezes mesquinho), excluem as mulheres demitindo a sua causa. A luta de classe fica mais fraca em número e análise.

Assim, o marxismo foi reduzido a um esqueleto materialista. Ao olhar económico as vitórias das mulheres no mercado de trabalho são exageradas. A igualdade formal confunde que o trabalho e a liderança feminina continuam desvalorizadas, com salários inferiores e com funções que a sociedade classifica de secundárias. O que não se expressa na aritmética do valor-trabalho torna-se invisível. As mulheres são agredidas nos recantos que o marxismo ilumina mal: o não-económico, o simbólico, o corpo. Para se regenerar o marxismo precisa do feminismo.

Um dos notáveis e primeiros contributos no debate sobre como fortalecer o marxismo com feminismo e o feminismo com marxismo é o livro: Women and Revolution - A Discussion of the Unhappy Marriage of Marxism and Feminism. Editado por Lydia Sargent. South End Press. 1981.

Comments:
Amílcar,

O que dizes estaria muito certo se nos informasses que "organizações de esquerda ofereceram às mulheres o trabalho secretarial." Há esquerdas e esquerdas, como há marxismo e marxismo. Meter tudo no mesmo saco é incorrecto.
Talvez a resposta esteja no livro a que referes. Prometo procurá-lo hoje, mas julgo dificil encontrá-lo, visto que os livros da South End Press apenas se venderem nas "casas de especialidade".
Não julgues que te vais ver livre desse tema com tanta facilidade, mas de qualquer maneira já trazes um conceito diferente dos demais.
 
não podia estar menos de acordo.
o marxismo desenvolve-se com base na divisão da sociedade em classes. não em sexos. a prática revolucionária carece de levar sempre em conta as necessidades de todo o proletariado. isso não significa que assim seja desde o primeiro momento.

sobre isso dos partidos de esquerda darem este ou aquele trabalho às mulheres... epá.. o meu não! vê lá não estejas a teorizar a partir do dogma que regra geral sai buraco.
 
Queres empirica? Do secretariado da comissao politica do teu partido sao 7 homens e 3 mulheres; a comissao politica do comite central tem 20 homens e 4 mulheres. No parlamento olha a tua volta em 11 direccoes, em so uma veras uma camarada mulher.
 
E isso prova o quê? A mim diz -me que dos 10 necessàrios ,apurou-se os 10 melhores 7 eram homens e 3 mulheres.O resto sao questoes de coitadinhos.
 
Já Clara Zetkin chamava a atenção dos marxistas para essa problemática das mulheres no proletariado, tendo mesmo debatido-a com Engels, Lenine ou Rosa Luxemburgo.
Essa não é uma descoberta de agora.
A questão aqui é que só uma sociedade socialista poderá colocar homens e mulheres num mesmo plano de igualdade.
 
Pois, entretanto o melhor é pegarem no balde e na vassoura (ou a caneta e o bloco de notas)...
 
É evidente que não. A mulher é tão necessária quanto o homem no processo de transformação social proposto pelo marxismo. Nisso o marxismo não erra.
Os movimentos marxistas continuaram a subjugar a mulher contrariando as premissas programáticas? É natural, os movimentos acabam por ser espelhos das sociedades.
Mas não duvidemos que foram os que mais fizeram pela emancipação da mulher.
 
A desculpa que os movimentos progressistas sao reflexos das sociedades entristece-me.

A mulher e' invisivel no marxismo. Eu queria dizer "no marxismo que tivemos", mas parece que tenho que dizer "no marxismo que temos".

E o que se avancou na emancipacao da mulher foi conquista da mulher, nao foi por conta da analise marxista.
 
De certeza que as mulheres que quiserem ser uteis hao de arranjar mais qualquer coisa,estilo cortarem as unhas dos pès aos maridos,e irem à tasca levantar o vasilhame.
 
Numa sociedade dividida em classes, onde existe luta de classes e uma classe exerce o seu arrogante poder sobre a outra, subjugando-a, acaba por levar a que se reproduzam essas relações no resto da sociedade, nomeadamente às relações entre homens e mulheres.
O Marxismo ao preconizar o fim das classes está também a propor e a indicar o caminho para o fim da descriminação das mulheres na sociedade.

A existência de classes é o principal factor para a descriminação das mulheres. O fim das classes é o fim da descriminação... Tenho para mim!
 
Pois è mas explicar isso a esta gente?
 
Já consegui o livro Amílcar, para se ir lendo.
Já vi que isto aqui está be manimado. Uma pergunta:o que divide a sociedade em classes?
 
Basicamente o poder econòmico.
 
Sim Busilis, mas qual a causa que leva à desigualdade deste poder?
 
O simples facto de com poder econòmico poderes ter mais seja o que for.
 
Mas donde vem esse poder económico?
 
não é irónico que as teorias de um profundo machista sejam apontadas como o caminho para a emancipação feminina?
 
Da riqueza acumulada?
 
o que se avançou não foi pela luta dos povos? sabes qual foi a primeira constituição do mundo a reflectir os direitos da mulher ao voto por exemplo? a reflectir a importância em pé de igualdade entre homens e mulheres na sociedade?

sobre a composição dos órgãos de direcção: não sabia que o meu partido era o culpado pelas actuais condições de vida das mulheres, que na maior parte dos casos lhes dificulta mais que aos homens a particição activa na vida política. Boa análise, cabral, mas esqueces-te que o meu partido não é um partido desligado da realidade, ele vive neste mundo é com as pessoas DESTE mundo que o quer transformar.

Se um qualquer partido tivesse muitas mulheres da burguesia na sua direcção, que tinha isso a ver com feminismo, sendo que seriam elas as novas executantes das orientações do capital para a exploração acentuada da mulher?
 
esta discussão já se aflorou de alguma forma aqui:

http://imperiobarbaro.blogspot.com/2006/03/paridade-concertada.html
 
"esqueces-te que o meu partido não é um partido desligado da realidade, ele vive neste mundo é com as pessoas DESTE mundo que o quer transformar."

Queres portanto dizer que e' preciso aceitar o machismo de alguns homens para os trazer para dentro do partido...
 
Nao a. cabral è preciso è fazeres um partido sò para ti, ou podes choramingar menos e lutar pela vida como fazem as pessoas.
 
Amílcar,

Existe uma autarquia no país que entre todos os seus elementos apenas tem duas mulheres como autarcas. Acontece que estas duas mulheres são membros do partido do Pedras. Isso significa que o partido do Pedras tem o feminismo como cavalo de batalha?

Busilis,
Acho que a causa é a relação das pessoas com os meios de produção.
 
a cabral,nao sei qual o partido do Pedras mas pergunto-te(no nivel que gostas de usar)isso significa que o partido do pedras è um bando de maxistas? No meu ver nao tem tanto a ver com quem dispoe dos meios de produçao.Quem estabelece o preço dos cereais nao dispoe de terrenos agriculas.
 
Ja cà faltavas lux.
 
lux,

A Clara Zetkin morreu em 1933, eu nao estou a falar das sufragistas.

O teu contraste e' classico, canonico de catecismo ideologico. A Luxemburgo-Zetkin-Kollontai vs as sufragistas burguesas, a par com o contraste Bernstein vs Kautsky, o contraste Kautksy vs Luxemburgo, o contraste Luxemburgo vs Lenine, o contraste Lenine vs Trotsky, o contraste Estaline vs Bakunine. Para cada um destes ha um par de livros de leitura obrigatoria, e uma moralidade clara. Assim se aprende Marxismo Leninismo.

Eu falo das mulheres da esquerda de 60 e 70, que ainda ai estao bem vivinhas para contar a historia.

O marxismo tem sido autista para a questao feminina, e nisso o PCP nao e' excepcao. A analise da questao feminina e' insistentemente salarial, sem aceitar nuances e acrescentos. E' preciso falar do corpo, falar de cultura, falar do abuso insidioso.

Nao vais e nem podes dizer que eu vejo noutras ideologias um melhor companheiro para a emancipacao feminina. Nao vais, nem podes me acusar de ser anti-comunista porque o meu argumento e' apelar ao feminismo para "regenerar" o marxismo.
 
O PCP està a falhar atao nao era mais simples promover O REGRESSO DAS SOPEIRAS? Agora a sèrio conforme demonstrou lux a.cabral hà aì muito trabalhinho de casa por fazer(nao ,nao me refiro ao corte de unhas do marido).A divisao ,seja ela qual for,sò interessa a quem quer impor um regime,modelo econòmico etc, que nao colhe o apoio da maioria.Deveria-mos começar pelo que nos une(deficientes condiçoes de vida)quando isso estivesse resolvido iriamos por aì fora atè chegarmos às tuas crises existenciais.Luta por um mundo melhor para todos.
 
Quais palavras sao minhas?

Da tua lista reconheco muitas iniciativas de grande merito.

Contudo a lista serve para distrair da questao. Os projectos leis que passaram a lei, foram apoiados pelos partidos moderados do Parlamento e constavam tb do seu programa eleitoral. Ha questoes que felizmente ja nao sao controversas para o centro politico. Se lermos o que fica dessa subtraccao sao algumas das questoes da maternidade e as da igualdade salarial. Nao critico o PCP pela luta salarial, acho pouco. Acho que alem de mulher trabalhadora, a mulher e' mais que uma mae.

O que retiro daqui e' que para o PCP a questao feminina responde-se com reformas, mas o capitalismo resolve-se com revolucao. O que eu digo e' que a emancipacao do trabalho tem que ser pensada a par com a emancipacao feminina.
 
Vamos fazer uma revoluçao para a.cabral poder ir ao cafè sozinha e o marido lhe dar o comando da tv para a mao.Sò por curiosidade,nao queres partilhar aqui onde foi que te sentiste negligenciada no trabalho por seres mulher?
 
E se adequássemos essas "bíblias partidaristas" aos nossos tempos?... Completamente ultrapassadas!...
 
Por nos termos vindo a "adequar" é que estamos onde estamos.A fome sentida no sec.I nao è diferente da fome hoje.
 
a. cabral, não acho que o PCP tenha uma visão reformista, os comunistas pura e simplesmente utilizam todos os campos de luta, nomeadamente o parlamento, para criar leis que melhorem a vida dos portugueses.

É claro que para os comunistas, a emancipação do trabalho está de forma inalienável ligado à emancipação feminina.

Lutar pela emancipação das mulheres, sem ao mesmo tempo não estar contra um sistema que se baseia na exploração, é que me parece contraproducente e vazio de sentido.
 
Amílcar,

(E agora José?) Como vais argumentar com esses revisionistas?
Eles trazem a lição (burocrática) toda na ponta da língua, mas revêm o marxismo com cravos, parlamentos, votos, golpes de estado, sindicatos, infiltrações e negociatas.
 
Olaio: Mas quem é que aqui não está contra o sistema de exploração????!!!!

Essa do futuro estará tudo resolvido também já cheira mal. É preciso ir construindo no presente, fazendo a diferença no presente...

Busílis: Acho que mais uma vez consegues ter um comentário bem bem edificante. Vá lá que não foi tão mau quanto da outra vez...

Mas hás-de explicar-me porque assumes que A. Cabral passa a ser mulher por defender a emancipação feminina?'Não se pode ter pilinha e fazê-lo, é?
 
Samir-jà percebi o teu problema,a minha critica ao "adequar" tem a ver com os modelos econòmicos que temos vindo a aceitar(estava a pensar na globalizaçao em concreto).Mais uma vez repito(sò prà xalaça ) o problema da exploraçao è de todos,mas quando apertares mais uns furos ao cinto vàis-te aperceber disso. Se fiz algum comentàrio "edificante"ou foi por engano ou estou a perder qualidades.Agora uma pergunta mais sèria,acompanho-te numa visita guiada,pelos bairros da periferia,para perguntares às mulheres realmente oprimidas o que as oprime.Eu, que sei do que falo(nao te assustes,è sò neste caso)garanto-te que è a precaridade,o desemprego,a falta de apoio(mèdicos,creches etc),isto sao problemas comuns.
 
Desculpa esqueci-me de acrescentar:"comuns"aos pobres.
 
Ninguém discute que isso são problemas comuns. A questão é o adiar das outras questões (menores, pormenores como estas manias que só dão na cabeça das feministas) que continuam a bater à porta para um dia melhor...
 
Ó samir,nao percebeste,a questao è o que serà prioritàrio.Estamos a falar de bens essenciais de que grande parte da poulaçao està privada.Isto vài-te soar bacoco,mas ninguem lê livros de barriga vazia.A nossa sociedade è realmente muito atrasada,primeiro hà que criar os meios para que se queira (realmente)desenvolver.Volto a frisar ,para isso è necessàrio dar-lhe primeiro o bàsico.È que depois disso é mais fàcil as pessoas tornarem-se "sensiveis",porque è disso que se trata,esta sociedade embrutece-nos,nao por ser lideradad por homens mas sim por ter como base a exploraçao do individuo pelo individuo.
 
não cabral,
refiro-me à necessidade de ser um partido constituido nas suas fileiras por mulheres tão exploradas quanto as outras, o que se reflecte obviamente na sua disponibilidade para a vida política. Ou agora, por ser comunista, uma mulher liberta-se dos grilhões sociais que a apertam?
Ou agora, o PCP deveria fazer uma campanha de recrutamento entre a burguesia para ter muitas mulheres nas suas fileiras a tempo inteiro?
E já agora, esqueces-te que o PCP é um partido com 86 anos e que as condições de vida da mulher há 20 anos atrás eram ainda piores do que hoje?

olha para a direcção nacional da JCP, para a sua comissão política e para o seu secretariado. talvez te espantes. com os sexos e com as idades.
 
Por essa ordem de ideias, porque e' dificil libertar as pessoas dos seus grilhoes, o PCP seria dirigido por intelectuais e a classe media. Como nao o e', pergunto-me porque e' que homens operarios chegam a dirigentes mas mulheres operarias nao?
 
Não samir machel, no futuro nada estará resolvido, no futuro outros, muitos outros problemas haverá para resolver.
E é no presente que se resolvem os problemas, nas manifestações à porta dos tribunais contra os julgamentos indignos de mulheres (felizmente parece ser coisa do passado), na defesa do emprego e principalmente, do emprego com direitos, no direito à educação e contra propinas que não são mais que um crivo, no direito à saúde, e muitos mais casos há para referir onde a luta HOJE se dá.

Essa luta é também a luta pela emancipação da mulher, porque é a luta por um mundo mais justo e melhor.

Dia 18 quando nos manifestar-mos em Lisboa contra a Europa do capital é igualmente pela emancipação da mulher que estamos a lutar.

É hoje e sempre, que se luta por um mundo melhor, não há outra forma!
 
cabral:

porque as mulheres operárias ainda têm mais dificuldades que os homens!!! aliás, basicamente era isso que eu queria dizer.

embora os homens operários tenham dificuldade em participar num partido político pelas condicionantes económicas, sociais e laborais; as mulheres têm-nas ainda mais.

a mulher trabalhadora tem uma sobrecarga de exploração. explorada porque e trabalhadora, duplamente explorada porque é mulher.
 
E o PCP alivia a carga das que militam, ao não as pôr na Assembleia da República?

Quando se sabe quão importante é o exemplo, neste caso de ver mulheres a intervir, para a mudança de mentalidades...
 
o pcp alivia-lhes a carga a ser o partido com mais mulheres autarcas em todo o país?

acho que vou retirar-me deste picanço. se eu sou desonesto, então isto o que é?

tu, sabendo perfeitamente que estas a acusar o pcp de um machismo ordinário, alinhando no discurso daqueles que puxam pela nossa imagem neanderthalensis, que não lhe reconheces, também estás a ser desonesto.

grrr, porque é que ninguém vai chatear o Berloque porque só tem homens no Parlamento Europeu?
 
samir machel, perguntas;
-"E o PCP alivia a carga das que militam, ao não as pôr na Assembleia da República?"

Não!

O PCP alivia a carga "das que" militam na sua organização, começando por náo ter qualquer preconceito,nem problemas morais resuluveis com quotas.
 
Nao entendo o complexo com a ideia das quotas para as mulheres. Uma das historicas exigencias do movimento operario e' a paridade entre trabalhadores e capitalistas na gestao - quotas!
 
a.cabaral,decididamente nao deves muito à inteligencia .O que è que isso tem a ver com cotas?
 
Antecipando a tua pròxima bacoráda,toma là ,quotas.
 
vem da propriedade privada, outrametade. da apropriação do trabalho de uns por outros, do roubo e da instituição "propriedade". não vem da dominância sexual feminina.

as mulheres também podem ser capitalistas e exploradoras. como os pretos também podem. ou os descendentes dos incas. só o proletariado não pode ser simultaneamente capitalista porque não se pode ser as duas coisas ao mesmo tempo.
 
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