13 março 2007

 

Bolseiros


São biólogos, geólogos, oceanógrafos, físicos e químicos. Mas também são sociólogos, economistas, historiadores, psicólogos. Mas perante a lei não são peixe nem carne. Não são bem estudantes mas também não são trabalhadores. São um misto de mão-de-obra qualificada mas precários até à medula. Suprem necessidades permanentes dos serviços, por exemplo de Laboratórios de Estado e Centros de Investigação, desfalcados de pessoas com formação mas que também não abrem os quadros.
São pau para toda a obra, mas fazem obra de qualidade. Quer se queira quer não, são o mais forte pilar do sistema científico nacional.

Mas, como seria de esperar, não têm contrato de trabalho, são mal pagos, não têm direito a subsídio de desemprego, e não pagam impostos pois a bolsa que recebem é considerada um subsídio e não um vencimento. Mas muitos querem pagar, contribuir para o Estado como qualquer cidadão. As suas contribuições para a Segurança Social são em regime voluntário (como as empregadas domésticas ou os bombeiros), e sempre indexadas ao Salário Mínimo Nacional.

Perante esta situação, e um universo de bolseiros no país desconhecido mas estimado acima dos 10.000, a Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC) resolveu por sua iniciativa propor um novo estatuto pois o actual é desajustado, injusto e vai contra as recomendações da União Europeia.

A principal exigência é uma coisa tão simples como um contrato de trabalho, a que têm direito como qualquer trabalhador. Fica aqui a Proposta de Alteração do Estatuto dos Bolseiros de Investigação documento e aqui a petição online para quem quiser subscrever a proposta.

Comments:
Sou ambivalente em relacao ao vinculo dos bolseiros-investigadores 'a funcao publica. Sem desprestigio para a funcao publica, acho que as universidades nao estao preparadas para receber investigadores. Se os fundos de investigacao passassem pelo orcamento das universidades menos ainda chegaria as maos dos bolseiros, e maiores seriam as perversoes e abusos de poder por parte dos catedraticos. Sera um parto dificil mas acho que exigencia devia ser uma carreira de investigador com autonomia das universidades e com prazos mais alargados, bolsas para institutos que se extendessem por uma decada, em vez de 4 ou 3 anos.
 
Mas aí estás a falar mais dos bolseiros de pós-doc (que não trabalham para a obtenção de um grau académico, mas trabalham simplesmente). De qualquer maneira, concordo com a criação de uma carreira de investigação.

Mas não se faz investigação só nas universidades: também nos laboratórios de Estado que são instituições que têm funções específicas de análises, por exemplo, para monitorizar parâmetros com influência na saúde pública. Isto é, tens bolseiros que de facto trabalham simplesmente. Aí deveria haver vínculo jurídico-laboral.

No caso dos bolseiros que estão a trabalhar na obtenção de um grau académico, faz também sentido ter um contrato de trabalho, nem que mais não seja como no caso espanhol (2 anos de bolsa + 2 anos de contrato, acho).
 
No caso alemao a maior parte dos doutoramentos faz-se por vinculo contratual, o rendimento e' anexado a metade de uma das categorias de rendimento da funcao publica.

De resto,...

... concordo com o Cabral nesta questao. A investigacao tem de ser reformada sem se colar 'a Universidade, acabando por prejudicar ambas as partes (aos problemas que o Cabral enunciou, acrescento os maus professores que mais gostariam de investigar do que de dar aulas, sobrecarga dos investigadores com a docencia).

Acredito tambe'm que uma boa parte dos problemas adve'm da falta de investimento em I&D no sector privado. Na Informa'tica veem-se alguns avancos, mas Portugal no geral continua a ser um pais em que se algue'm pensa investir, e' para arranjar pedreiros e criadas de limpeza. No caso alemao sao vulgares os doutoramentos em empresas, e o privado contribui para grande parte do emprego de investigadores.
 
Estranho o conceito que o estudo para um grau confira vinculo contratual. Se o objectivo e' investigar para um doutoramento tutorado por um docente, entao nao percebo como possa confererir ordenado, por troca de que servico?

A area acizentasse quando as bolsas nao sao suficientes, e os doutorandos sao convidados para leccionar ou cumprir funcoes administrativas. Nesse caso seria criminoso se nao conferisse ordenado e nao tenho duvidas que pode/deve ter vinculo 'a funcao publica. Creio que e' o que acontece em Espanha em que as bolsas sao curtas. Acontence na Alemanha ou nos EUA em que os estudantes de doutoramento leccionam, porque os custos do ensino sao elevados.

Para substituir bolsas entregues directamente aos doutorandos por contractos, nao vejo qual a racionalidade. Quem desiste de um doutoramento e' despedido? E quem e' despedido e' impedido de se doutorar?
 
Alguém tem dados de quantos bolseiros fazem actividades correntes, e não são verdadeiramente estudantes?
 
Tudo leva a crer que as bolsas da FCT estao a servir de suplemento aos orcamentos administrativos das Universidades. Alunos passam meses com bolsas FCT, a fazer secretariado para Professores sem tocar na investigacao. Transformar as bolsas em contractos com vinculo de funcao publica parece-me sancionar esta perversao. A exigencia devia ser que as bolsas sao para garantir ao estudante a exclusividade 'a investigacao sem precisar de manter actividades adicionais para se financiar.
 
O citar do exemplo alemao nao era um apoio ao exemplo em si, so' estava a referenciar o caso. O principal problema que eu vejo em seguir este exemplo alia's e' bastante simples. Passando nao tanto a haver bolsas, mas sim contractos, naturalmente estes teem de ser celebrados (como e' feito aqui) em primeiro lugar com a instituicao de acolhimento. Isto quer dizer, sao criadas por assim dizer vagas para doutoramento no Instituto (grupo de trabalho, o que for) e cabe a esse decidir quem preenche essa vaga. Ou melhor, nao ha' qualquer tipo de controlo exterior para quem as preenche, o "boss" do sitio e' que decide, o contrato esta' nas maos dele. A coisa funciona na Alemanha? Acho que a resposta e' um moderado sim.

Mas o sistema em Portugal seria pro'ximo de catastro'fico, era uma luz verde para os grupos passarem a colocar os seus nos lugares de doutoramento (perpetuando a mafia que se ve em muitos dos sistemas universita'rios mediterranicos... deve ser da brisa...). O me'rito dos candidatos poderia ser alvo de menor escruti'nio e a tendencia seria para o sedentarismo (alunos formados numa universidade a tirar o doutoramento e post-doc na mesma)...
 
só uma informação rápida para melhor se perceber a dimensão do problema: a própria FCT tem bolseiros a trabalhar para ela, e naturalmente não estão a fazer investigação. Se não me engano, a maior parte destes bolseiros têm bolsas de gestão de ciência (se o nome não é este é algo parecido) e asseguram necessidades permanentes de serviço da FCT em termos de processamento dos pagamentos dos bolseiros de doutoramento, preparam concursos para financiamento de projectos, aceitam as candidaturas e processam-nas. Enfim, são trabalhadores em toda a plenitude, excepto no facto de não terem contrato de trabalho
 
Haver Bolseiros de Investigacao a fazer secretariado ou outro tipo de trabalho que nao seja a sua investigacao e’ um problema grave. Mas acabar com estes abusos nao passa por ligar os bolseiros a contractos com as universidades/institutos. Passa por se abrirem vagas de gestao ou de apoio ‘a investigacao com progressao de carreira. O objectivo das bolsas deve continuar a ser o de financiar investigacao, mais financiar investigacao independente. Acho que a possibilidade de um estudante de doutoramento ou posdoc poder desenvolver a sua pesquisa com o seu proprio financiamento e’ fundamental.

O que se mistura aqui sao casos de instituicoes que estao a (ab)usar bolseiros para ter efectivos sem lhes dar direitos, sem sequer lhes pagar (porque a FCT paga). Estas pessoas nao deviam estar a receber bolsas para investigacao. Deviam ter direito a contracto de trabalho. O importante e’ diferenciar – quem recebe bolsa para formacao (mestrados, doutoramentos e posdocs) que seja so para investigacao (para nao se estar nas maos dos profs); quem presta servicos para a instituicao deve ter contracto e vinculo.
 
E contrato individual de trabalho não é a mesma coisa que função pública.

Mais a mais com as bolsas, esses trabalhadores regulares perdem também direito ao 13 e 14 mês, a férias, subsídio de desemprego, reforma adequada, etc.

Atenção que mesmo os de "formação", a fazer doutoramentos o fazem muitas vezes por falta de alternativa. O doutoramento passa quase a ser mais um emprego (em que durante quatro meses não se pensa mais no assunto) do que propriamente formação. E tal não é exclusivo de Portugal...
 
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