22 dezembro 2006
O futuro não foi ontem
As memórias são daqui. Só sei recordar em conversa e convívio. Numa discussão saqueamos as nossas histórias privadas em busca de ilustrações para os nossos “argumentos decisivos.” À mesa familiar como é do tom da época ensaiam-se ambiciosas tragédias e comédias (isto se uma TV nao abafar as vozes). Quando ouço uma música que me evoca uma associação passada, enceno esse tempo com novos significados, detalhes e urgência.
Toda a memória é presentista e performativa. As memórias colectivas tem esta estrutura. Em Portugal e contradizendo dos queixumes recentes de Pacheco Pereira, há um excesso de memória. Por Lisboa temos inscrita em pedra a memória de um tal Portugal conquistador no século XV. E os assessores da imagem lisboeta decalcam esse épico em estações de metropolitano e mosaicos viários.
Das abundantes narrativas, a que me é mais proxima é a da “memória do desespero”. Face ao congelamento político deste país, com uma intelectualidade submissa e uma economia captiva, recordamos que foi sempre assim. Nas conversas que fazem a dramatização desta memória alguém se lembra de afirmar o 25 de Abril como excepção. Mas esse evento abandonado na multidão doutros tempos sem revolta, não contradiz o pessimismo, confirma-o. O 25 de Abril fetichizado no discurso mas esmagado e distante da prática só agrava a doença.
Não quero descobrir a esperança numa memória. Sei que poderia conseguir ambas com facilidade, lembrando as revoluções do passado, de regicídio a revolta camponesa, com as lutas sindicais e populares que obrigaram a burguesia a acorrentar o país com uma ditadura. A história e memória dá-nos tudo o que quisermos, mas também nos afasta daqui.
Interessa-me não estar para ai virado. Porque não antes recordar o futuro? Porque não dramatizar o desejo?
Comments:
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é impressão minha ou este post foi inspirado pelo recente desfecho do processo de que foi vítima Duran Clemente?...
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