21 julho 2006

 

Postal de Belgrado


Visitámos Belgrado, mochilas no lombo, em trânsito para um festival de música. A cidade não é diferente de outras capitais europeias, as mesmas lojas, estatuária, histórias de heroísmo para confirmar o estado nação – ao caso, o combate anti-nazi na segunda guerra mundial.

Os eslavos que têm uma muscular e monumental presença, são simpáticos e sorriem aos turistas que arranham umas palavritas da língua local. À noite as ruas inundam-se de passeantes enamorados a fugir ao calor de quatro paredes, desaguando numa fortaleza que mira os rios Sava e Danúbio. Nas esplanadas bebe-se boa cerveja e os grelhados são volumosos.

Não consigo discernir traço, em lides tão banais, do tal feroz e bárbaro povo sérvio que sem a contenção dos exércitos da OTAN mataria os seus irmãos na Bósnia, e no Kosovo. Nas conversas não se ouve revolta ou ódio pela fractura da Jugoslávia em micro-estados. Antes, o protesto é contra o absurdo que se sente no dia a dia. Evita-se a cerveja eslovena que é caríssima porque é importação. Já não se viaja para banhos no mar adriático porque a Servia é agora uma prisioneira continental. Fala-se a mesma língua, as famílias estendem-se além fronteiras mas os passaportes e as embaixadas têm cores diferentes.

O principal traço dos anos 90 é o de um trauma, silencioso. Ninguém se pronuncia sobre os bombardeamentos da OTAN para não reanimar o medo e pesadelo do passado. O terror não é difícil de visualizar, no centro da cidade avizinhando habitações e centros de comércio ficaram as enormes feridas das bombas “civilizadoras.” Esburacando o betão para edificar ruínas. Assim em Belgrado, assim em Bagdade, assim em Cabul, assim em Gaza, agora em Beirute…



   

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