14 março 2006
A origem do ultra-liberalismo
Temas historiográficos têm animado as mais recentes discussões aqui n’ obitoque. Interrogamo-nos: que explicação é dada na história curricular à tomada de poder de Oliveira Salazar? que justificação se propagandeia na televisão portuguesa para o colonialismo luso? Abandonando o nosso cantinho de temáticas nacionais, quero me referir a uma historiografia estrangeira, Americana.
Quem ler o que vão escrevendo os académicos progressistas sobre a história intelectual e social Americana, encontrará um tema omnipresente: a guerra-fria. Estes são classicamente estudos históricos de uma comunidade intelectual (economistas, climatologistas, biólogos…) que se secciona em controvérsia e combate institucional. A guerra-fria serve de incontornável contexto, exógeno, pré-determinado, que invade a comunidade e que a fractura.
Nem tudo o que está em oferta, é convincente. Há um vício de moda intelectual nestas contribuições, como se atribuir a causalidade à dinâmica da guerra-fria dispensasse discussão, ou análise dos detalhes, dado o volumoso consenso em torno desta explicação. Mas esta historiografia tem dois grandes méritos. Primeiro, previne-nos de esquecer o escaldante domínio que a guerra-fria teve sobre a nossa história recente. É demasiado frequente a vontade de impor sobre o passado a imagem uniforme que temos do presente, e esquecer que há quatro décadas o futuro do capitalismo estava em dúvida, dadas as lutas de autodeterminação no terceiro mundo, e revolta operária e estudantil no primeiro mundo. Nesses tempos também havia terror mas era de outra ordem, não afligia os tripulantes de aviões e comboios, mas os magnatas do imperialismo.
O segundo grande mérito desta historiografia é apontar-nos que o presente não tem um passado muito distante. O inverso de querer fazer o passado à imagem do presente, é igualmente falacioso, querer fazer do presente a herança de um passado milenarmente profundo. É o que ouvimos nas litanias neo-liberais que atribuem para si o prestígio de uma longa tradição intelectual, que viaja do iluminismo escocês do Adão Smith passando pelo austrianismo de Menger, von Mises e Hayek até chegar ao presente. A atribuição é absurda, como movimento intelectual o libertarianismo de direita é uma invenção nascida da crise do capitalismo nos anos 60-70, quando este temia pela vida. Este novo edifício intelectual foi edificado estrategicamente como uma utopia para sarar a crise interna (económica) do capitalismo Americano e como forte com o qual se recolher contra o ataque externo (a guerra fria, e a esquerda). É este o correcto contexto dessa “nova ciência social” que com 30 anos de atraso vai chegando Portugal, via os blogs vedeta da direita.
O conservadorismo torna-se libertário, veste-se com a ficção de estar a propor um novo modelo civilizacional, quando de facto o programa pouco mudou – a privatização total nossa existência social. Assim se entende como os neo-conservadores são o braço militar dos neo-liberais, nasceram do mesmo parto, são gémeos falsos, cuja paternidade não é o liberalismo escocês, mas o cavernoso imperialismo de Richard Nixon.
Comments:
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Mas para certos sectores da elite intelectual americana, agora está na moda bater nos neo-cons. Há gente que acorda demasiado tarde... ;-)
After Neo-Conservatism
Francis Fukuyama
http://zfacts.com/p/236.html
After Neo-Conservatism
Francis Fukuyama
http://zfacts.com/p/236.html
Será que a Eva (da Clínica Persona*) foi criada para agradar a este Adão? Afinal, estamos a falar do começo dos mundos...
*Ver texto "Ser Mulher" de Feminine Mystique de 8 de Março e o comentário do Amílcar.
*Ver texto "Ser Mulher" de Feminine Mystique de 8 de Março e o comentário do Amílcar.
Ao Adao Smith? Nao sei se o filosofo era dado a prazeres carnais. Alias acho que naquela altura para seres academico tinhas de ser celibatario. Imagino-o como um Cesar das Neves...
O gajo devia ser era bem resmungao - um oficial alfandegario cuja principal conclusao da sua politica economica era o fim dos tributos alfandegarios.
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O gajo devia ser era bem resmungao - um oficial alfandegario cuja principal conclusao da sua politica economica era o fim dos tributos alfandegarios.
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