28 março 2006

 

César das Neves, o travesti


“Algo vai podre na intelectualidade portuguesa.” A traição que assombra este Hamlet foi perpetrada por uma classe académica, e o seu crime é perpetuar o nosso pasmado provincialismo.

Quis saber como descrever os intelectuais portugueses e a sua vassalagem às grandes obras do pensamento anglo-saxónico. A minha primeira hipótese foi que os intelectuais lusos são caricaturas. Mas a caricatura tem funções educativas. Ao sublinhar expressões, e características físicas, o lápis do caricaturista parece revelar uma personalidade escondida. O caricaturista sugere algo de novo sobre o seu objecto, descobre, inventa. Os intelectuais portugueses decalcam, não caricaturam. O que pretendem é uma reprodução fiel do objecto mas oferecem só uma copia barata e sem forma.

Assentei que talvez sejam transformistas, como num show vestido de Marilyn Monroe e bambolendo ao som de uma asmática gravação da voz da actriz. João César das Neves escolhe como a sua Marylin Monroe, o economista Milton Friedman – Prémio Nobel da Economia, sumo-sacerdote do movimento Monetarista e neo-liberal. Até o título das crónicas de César das Neves é decalcado das séries do "grande homem" para a Newsweek. É um plágio que ninguém protesta porque ninguém quer saber dos tugas. É um decalque que vem com três décadas de atraso, sendo argumentos esgrimidos nas lutas ideológicas dos EUA-RU nos anos 60 e 70. Como a defunta Monroe, é um defunto liberalismo. César das Neves veste a peruca, e abana umas penas para ensaiar a ilusão espectular, mas nunca cobre totalmente um outro que acena por detrás dos enfeites. A espreitar por entre a pretensa sofisticação anglo-saxónica está um paternalista católico, de ténue e encolhido liberalismo. Indo mais longe com a metáfora, deduzo que o Diário de Noticias, o palco para o show César das Neves, só pode ser um cabaret. Eis uma teoria social com promessa...

Comments:
tb se pode interpretar a caricatura noutro sentido: o de pegar em determinadas características e exagerá-las. pode ter o objectivo de ridicularizar com propósito educativo, pode ser uma tentativa frustrada de cópia barata, ou pode ser ainda um exagero não para ridicularizar mas para mostrar as amplas virtudes (tomando a parte pelo todo).

acho que o caso do j. césar das neves acaba por ser um bocadinho das duas últimas: faz cópias baratas daquele que pretende glorificar, e pega em alguns aspectos para mostrar as virtudes.
 
Excelente análise ao provincianismo vulgar de uma certa classe intelectual, académica e opinativa. O JCN é apenas um exemplo.
 
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