20 janeiro 2006
O meu voto
Nesta democracia burguesa, não temos direito a muito. Portanto, faço questão de usar o pouco que me dão, neste caso ir votar. Evidentemente que a probabilidade de influenciarmos o resultado só me faz lembrar o Totoloto (não falo do Euromilhões pois isso seria exagerar). Não pertencendo o meu voto a ninguém, analiso a situação concreta e, de quando em vez, verifico que lá devo engolir uns sapos.
Das eleições em geral, as presidenciais em particular são das eleições mais complicadas para alguém que não se reveja na esquerda que temos. Nestas, temos de votar no garante desta democracia que ninguém leva a sério. Será que teremos de considerar “revolucionário” um presidente que demita um governo que minta às pessoas, governando com um programa diferente do que se apresentou às pessoas? No entanto, só um candidato o sugeriu. Chegamos a um ponto onde o óbvio é radical, pondo a nu esta democracia de fachada.
Nestas eleições voto contra Soares e Cavaco. O porquê deve-se a estes terem sido os responsáveis pelas decisões mais importantes dos últimos trinta anos. Em resumo: terem grande parte das responsabilidades de estarmos na situação actual. Dir-me-ão que estamos melhor do que no tempo da ditadura e eu concordarei. No entanto, teria de lhes perguntar onde estaríamos se outros projectos tivessem sido implementados, ou se simplesmente tivéssemos sido governados por gente mais competente e menos parasitária. Com a libertação do atavismo ditatorial e com os milhões da Europa não teria sido assim tão difícil fazer um bocadinho melhor, não acham?
Quanto ao Alegre reduzo-o à importância que tem, isto é, teve nas décadas de democracia. Foi um colaboracionista de segunda, de vez em quando de terceira, da ordem vigente. Sempre que foi preciso esteve ao lado do PS e da política que nos levou aonde estamos. Mas confesso um pequeno segredo. Se no dia 22 a luta pelo segundo lugar e uma eventual presença na segunda volta se resumir a Soares e Alegre conforme nos dizem as pouco fiáveis sondagens, prefiro que seja este último. Primeiro, porque tenho memória e gostava de ver Soares claramente derrotado. Infelizmente será mais difícil com Cavaco. Segundo, porque era uma resposta adequada à reacção corporativa e inaceitável dos partidos, incluindo os da esquerda parlamentar, contra uma candidatura não apoiada por um deles. Não percebo o que PCP e BE ganham em entrar nestas discussões, especialmente quando parte do eleitorado de Alegre provavelmente alimentaria a abstenção.
Chegamos aos ”meus” presidenciáveis. Desejar o impossível já lá vai e os senhores que temos são o Jerónimo, o Louçã e o Garcia Pereira. Todos eles têm dito coisas importantes durante a campanha e reconheço-lhes mais competência que na corja que nos tem governado (o qual digo abertamente a amigos, conhecidos e outros). Se acreditasse nesta democracia, certamente votaria fielmente neles. Mas não acredito. Também, infelizmente, as políticas reformistas levam-nos à política do absurdo. Assim, sou forçado usualmente a utilizar a escala do nojo para decidir o meu voto: aquele que tiver menor pontuação e que não ultrapasse um limite máximo suportável ganha o meu voto. Confesso que desta vez a luta vai forte. Gelei com a visita de Jerónimo à escola da PSP, com os argumentos inacreditáveis (Cavaco poderia levantar obstáculos ao arrependimento e viragem à esquerda de Sócrates!), ou com a preparação de eventuais sapos. Louçã definiu Cavaco como inimigo primordial e assegurou-nos que votaria Soares numa segunda volta, apelou ao voto dos socialistas e indignou-se com o “ataque cobarde” que um ex-combatente terá feito a Soares. Perante isto resta perguntar se não farão parte da mesma esquerda? Quanto a Garcia Pereira é importante recordar as posições anti-revolucionárias do seu MRPP durante o PREC ou a “péssima educação” dada a tantos actuais VIPs da política portuguesa, de Durão Barroso a José Lamego, que ele próprio recentemente referiu. Quanto ao comentário de haver democracia na Madeira, mesmo que burguesa, prefiro nem comentar. Como podem imaginar a competição está renhida.
No entanto, não lhes digo em quem vou votar. Só lhes posso garantir uma coisa: tentarei evitar uma eleição de Cavaco à 1ª volta. Infelizmente nulos não contam e nas eleições presidenciais até nos retiram o direito ao branco. Nesta democracia somos mesmo obrigados a votar neles. Sem palavras fico para os 60% a 75% dos eleitores que irão votar nos dois grandes responsáveis da actual situação.
Quanto a uma segunda volta e caso nenhum dos “meus” passe é certo que vou outra vez votar. Mas não em nenhum deles.
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