19 janeiro 2006

 

Decifrar o conflito na Costa do Marfim


Nos últimos dias jovens na Costa do Marfim combatem as tropas da “paz” das Nações Unidas. A forma do combate começa a ser clássica no século XXI, pedras e artesanato incendiário, em estilo de intifada. O estrondo do motim assoma as ruas, de Gaza a Seattle, e de Paris a Abidjan. Não se leia romantismo nestas palavras, pretendo somente notar uma forma de expressão politica que se repete no palco global.

A intenção dos jovens não é difícil de se entender. Reagem a exigência por parte das Nações Unidas que o Parlamento seja dissolvido, o preâmbulo para uma partilha do poder pelas facções rebeldes. Esta ingerência soa a agressão até porque vem pela voz da França, que enviou os soldados da “paz”. É que no papel pode estar inscrito “Nações Unidas”, mas quem arbitra o conflito da Costa do Marfim é a antiga potência colonial e actual principal investidor naquele pais.

Esta é uma história conhecida mas mal compreendida. Como em tantos outros casos nascidos do pós-1989, e note-se que só desde então, assiste-se à divisão de um país em fracturas aparentemente étnicas. A legitimação internacional destes movimentos rebeldes faz-se na linguagem do multiculturalismo e multi-etnicismo, nota-se como as gentes falam dialectos ou línguas diferentes, que tem religiões e ritualismos que não se interceptam. E para os especialistas até nos rostos e nos corpos se notam distinções. Os estados nação fragmentam-se com a descoberta da etnicidade.

Actualmente, aceita-se no discurso político o primado do étnico: a etnia é algo de primário e essencial, de impossível manipulação e a privilegiar acima de tudo. Contudo, a etnia não é independente nem da história nem dos interesses económicos e geopolíticos. Todas as culturas e identidades são construções traçadas por interesses, sejam estes indígenas ou imperiais. Famosamente, a distinção entre Tutsi e Hutus foi uma fabricação das teorias eugénicas do Império Belga.

No final do século XIX, as potências europeias impuseram um mapa à Africa. Hoje, desenham-se novas fronteiras em nome da etnia, mas quem preside sobre a divisão são ainda os senhores do século XIX. A cortina do discurso étnico esconde um enredo de interesses e a cobiça pelas grandes riquezas do continente Africano.

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19 de enero de 2006: expolio del Archivo de Salamanca
 
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